sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A FAMÍLIA DE MINHA AVÓ PATERNA

                   A FAMÍLIA DE MINHA AVÓ


O pai de minha avó Mariquinha, José Hipólito Gonçalves, é mineiro, nascido ali pela década de cinquenta do século dezenove. Minha tia Lisota do Buracão diz que ele viveu em Nova Rezende, onde era homem de certas posses e influência, alfabetizado, o que lhe dava um certo status. Tia Lisota o descreve na velhice, magro, de longas barbas brancas e cristalinos olhos azuis. Paternal, conselheiro, os netos o chamavam de "papai grande". Casou-se com Maria do Carmo Ribeiro, com quem teve muitos filhos: Maria José (minha avó), Olímpia (madrinha de meu pai), Castorino (que morreu assassinado), Olímpio (que constituiu família em Curitiba), João (que morreu em Londrina), Antônio, Sebastião, e muitos outros.

Minha bisavó morreu jovem, e foi enterrada em São José do Rio Pardo, no velho cemitério que mais tarde se tornou o Jardim do Artese, e mais recentemente Praça dos Três Poderes. A vó Mariquinha, subindo em direção ao mercado, apontava o lugar em que sua mãe tinha sido enterrada para as netas.

Viúvo, meu bisavô vinha passar longas temporadas na Fazendinha, onde morava sua filha e netos. Casou-se novamente com América, e continuou procriando largamente. Quando brigava com a mulher, voltava a buscar refúgio na Fazendinha. Um desses filhos do segundo casamento, casou-se com Etelvina, e morou em Guaxupé, perto da Catedral, com a filha Marieta. Vigoroso bisavô Hipólito, cujos filhos brincavam com os netos da mesma idades. Sua prole era conhecida pela valentia. Mineiros de machice comprovada, não levavam desaforo para casa, e inspiravam respeito cauteloso. 

Um de seus filhos, Pedro, matou o sogro, colocou-o nas costas e o levou para dentro da igreja na missa dominical. Ninguém moveu um dedo! Anos mais tarde, na casa de minha avó, ele se desentendeu com meu tio Castor, que lhe deu uma cabrestada nas costas. Minha avó se encolheu de terror. Quando meu tio saía para o cafezal, ficava sobressaltada. Mas ele não se vingou de meu tio, nada aconteceu.

Também ouvi falar de um certo Julinho Hipólito, de Muzambinho, sobrinho de meu avô, que foi assassinado no bar de sua propriedade, ali perto da estação do trem de São José do Rio Pardo. Tinha uma filha chamada Benedita.

E havia um certo Benedito Hipólito, que trabalhou com meu pai, também sobrinho da minha avó.

Tinha ainda o Castorino, que morava em Vargem Grande do Sul, e pode ter morrido assassinado. Pobre, minha avó mandava a tia Lisota e a Bizuca com uma sacola de mantimentos, tentando ajudar...

Poucas histórias, mas sempre com um tônus pesado, de gente braba... Mas falemos das mulheres.

A Olímpia era madrinha de meu pai. Casou-se com Sebastião de Lima. Alta, magra, com seus vestidos longos de fazenda preta, fazia macinhos de palha de milho para vender. Naquele tempo, fumava-se fumo de corda, e a palha para envolver o fumo picado tinha grande procura. Não vou explicar agora como se preparava o cigarro naquele tempo... Picar o fumo, alisar a palha, envolver o fumo picado, passar a língua na palha... Você não vai entender, qualquer dia faço um vídeo... Mas voltemos à minha tia-avó... A minha irmã Mariinha, a Lisota a acompanhavam até o sítio do Domiciano para buscar palha. Descascavam as espigas, parcialmente, senão o Domiciano protestava, enchiam sacos de estopa, e voltavam com os sacos na cabeça, estrada afora... Em casa, a palha era alisada com uma concha de caramujo, medida, cortada. Faziam-se maços de 20 palhas. Acumulavam-se dois, três milheiros de maços, que eram enviados para um atacadista em São Paulo, pelo trem da Mogiana. A vida de madrinha Olímpia girava em torno desta atividade, obsessivamente, e ela reclamava das visitas que interrompiam seu trabalho e sujavam sua casa. Ambiciosa, dizem que comprara sua casa com o produto de seu insignificante lavor. 

O marido, Sebastião, era galinheiro. Profissão importante naquela época. Ia para sítios e fazendas com uma carroça puxada por um cavalo, para vender pão. Trocava por galinhas e ovos que vinha vender na cidade. No fundo do quintal, tinha um galinheiro, lógico! Um lindo quintal, cheio de jabuticabeiras, goiabeiras, laranjeiras, abacateiros, limoeiros, folhagens e flores que ela cuidava com muito amor. 

Madrinha Olímpia não teve filhos, e adotou uma menina, a Maria Bodinha. Má hora em que teve a ideia de adotar a menina. A Maria era indisciplinada, gostava de rapazes, acabou se casando com um empregado da Padaria Alemã, o José, e a vida deles era um inferno. Ele era muito mulherengo, e ela também tinha um tesão enorme. Brigavam. A Mariinha, minha irmã, ia visitá-la no sobradinho perto da estação, e era muito bem recebida, com muitos agrados. Um dia a briga do casal chegou ao extremo, José atirou na Maria, e eles se separaram. Ele quis voltar, e contra a vontade da madrinha Olímpia, ela aceitou. Mudaram-se para Muzambinho e... anti-climax... nunca mais se ouviu falar deles.

Minha tia Lisota do Buracão falava de uma tia Maria, que morava ali perto da Leco, laticínios, ali em São José do Rio Pardo. Era costureira, tinha duas ou três filhas. Fazia vestidos de casamento, e até mesmo o terno para o noivo. Mas quem sobrou para contar?






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